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segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Ceci Cunha - Obrigado por sonhar


Por Fabio Godoy
Para que com a lembrança seja possível mudar o futuro, é preciso que o olhar para as mulheres considere suas potencialidades, que reconheça que são ativas na constituição da sua imagem pública, que seja menos coisificado com estereótipos criados sobre o feminino.

Ceci Cunha, originária de uma família humilde de agricultores, composta por nove filhos, nós mostrou que é possível ampliar romper a identificação entre saber e ver, onde o que consideramos saber da mulher é aquilo que vemos sobre ou da mulher nos meios de comunicação, e que muitas vezes forçosamente é replicado na vida real.

Vítima da violência, tradicionalmente ligada, no Ocidente, a relação da mulher e do homem, e de todas as experiências afetivas, emocionais, cognitivas, sociais, que se consagram nessas relações, Ceci foi assassinada em 1998, após cumprir dois mandatos como vereadora e ser reeleita como deputada federal, com destaque entre os mais votados. Ceci morreu assassina com uma flor branca que havia ganho nas mãos calejadas pela lembrança da infância onde cortava palma.

Tão comum e tão acintoso, mais uma vez o desejo de um homem, se transformou em violência, desta vez a paixão por seu posto de deputada em Brasília teria motivado seu suplente a encomendar seu brutal assassinato.

No mundo grego, clássico, cheio de tragédias, o ideal era a moderação, a prudência, não havia uma valorização das paixões, nossa modernidade, valoriza a paixão, portanto valoriza a desmesura, o excesso, valoriza o excedente, que por vezes leva a violência e a agressão, é preciso que todos, estado, imprensa e sociedade estejam atentos, e preparados para combater isto.

Não é possível admitir que se feche a força o novo e belo olhar sobre as mulheres que Ceci nós mostrou possível, precisaremos como ensina Herbert Marcuse reconciliar o masculino e o feminino, potencializar os valores que estão no imaginário coletivo da sensibilidade, da receptividade, da não violência, para que se tornem emissários de uma nova e mais efetiva democracia.

Ceci foi levada a ser deputada federal, por sua afetuosidade e carisma, que a dotaram de uma força persuasiva, que se contrapunha ao que todos esperavam de uma mulher simples, nascida para casar, não para estudar, como pensava sua mãe, que a proibia de estudar. Essa força de Ceci, captada pela população que deu a ela quatro mandatos eletivos, foi inconcebível para alguns, e combatido de maneira desleal por quem teve medo de perder os seus cargos, componentes de uma sociedade totalmente dissocializada, porque os fatores de coesão social não estão mais dados.

Por justiça, em memória de Ceci, em respeito as suas lutas, é preciso que o crime seja julgado, os responsáveis punidos, e nunca esquecido, e que sejamos capazes de construir um tipo de intervenção coletiva num espaço recíproco, compartilhado, onde a ação seja irmã do sonho.

Obrigado por sonhar conosco Ceci.

Conheça mais sobre Ceci aqui: http://www.queremosjustica.com.br/ceci.php

"No dia 19 de Janeiro de 2012, ocorreu o julgamento histórico considerado um marco contra a impunidade no Brasil.

Após três dias de julgamento, o médico e ex-deputado federal Talvane Albuquerque foi condenado a uma pena total de 103 anos e 4 meses de prisão em regime fechado."
 
Fabio Godoy é Militante, e presidente do PSDB em Pirituba.